“De acordo com a legislação portuguesa (Lei de bases da política e do regime de proteção e valorização do Património Cultural - Lei 107/2001 de 8 de setembro), o património arqueológico é constituído por todos os vestígios, bens e outros indícios da evolução do planeta, da vida e dos seres humanos, cuja preservação e estudo permitam traçar a história da humanidade e a sua relação com o ambiente, nomeadamente os obtidos no âmbito de atividade arqueológica como disciplina científica”.
“O património arqueológico integra depósitos estratificados, estruturas, construções, agrupamentos arquitetónicos, sítios valorizados, bens móveis e monumentos de outra natureza, bem como o respetivo contexto, quer estejam localizados em meio rural ou urbano, no solo, subsolo ou em meio submerso, no mar territorial ou na plataforma continental”.
“O património arqueológico é património nacional, uma vez que constituem testemunhos com valor de civilização ou de cultura, portadores de interesse cultural relevante e refletem valores de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade, ou exemplaridade, competindo ao Estado proceder ao seu arquivo, conservação, gestão, valorização e divulgação”.
A atividade científica e arqueológica no concelho de Carregal do Sal iniciou-se no final da década de 80 do século XX com diversas intervenções nos monumentos megalíticos concelhios, tendo como parceiros a UNIARQ e a FLUL, através do Projeto de Estudos Arqueológicos da Bacia do Médio e Alto Mondego. Depois de um interregno de alguns anos a investigação científica retornou ao concelho de Carregal do Sal desta feita sustentada no projeto NeoMega (Neolitização e Megalitismo na Plataforma do Mondego: investigação, recuperação, integração e valorização patrimonial) e posteriormente com o projeto NeoMega2 (Antigas Sociedades Camponesas e Megalitismo na Plataforma do Mondego).
Atualmente Carregal do Sal acolhe duas campanhas de escavação arqueológica anuais, apoiando assim o prosseguimento de ações proteção, investigação e valorização de todo o património arqueológico do concelho, promovendo também a sua divulgação junto da comunidade local e público em geral.
O espólio exumado e resultante de diversos anos de atividade arqueológica, encontra-se patente na sala de exposições permanente de Arqueologia do Museu Municipal Manuel Soares de Albergaria, para que possa ser visitado, estudado e apreciado. Contamos consigo para nos visitar.
O concelho de Carregal do Sal possui vestígios arqueológicos, patrimoniais e arquitetónicos que remontam à Pré-história, estendendo-se estes, até à Época Contemporânea. Esta longa diacronia histórica em plena plataforma do mondego resultou da existência de excelentes condições naturais e abundância de recursos hídricos, agrícolas e geológicos que foram cruciais na atração e fixação dos primeiros grupos humanos na região.
Datam de há cerca de 7000 anos atrás os primeiros vestígios da presença humana neste território (Período Neolítico). Pequenos recipientes de olaria e simples instrumentos líticos, faziam parte do equipamento destes pastores/recolectores.
Há cerca de 6000 anos surgem as primeiras evidências da pressão humana sobre o espaço com a construção dos primeiros monumentos megalíticos de dimensões modestas, manifestações de uma arquitetura funerária que marcaria uma paisagem arbórea essencialmente constituída por carvalhos. No final do período Neolítico, profundas alterações eclodem nestas comunidades, onde as crescentes rivalidades entre grupos despoletam a monumentalidade e complexidade arquitetónica das estruturas funerárias como são exemplo a Orca de Fiais da Telha ou a Orca da Palheira.
Do período Calcolítico, que corresponde à primeira idade dos metais, assistimos ao surgimento da metalurgia do cobre e inevitavelmente a uma evolução tecnológica e socioeconómica. Exploram-se terras com boas capacidades agrícolas e aperfeiçoam-se as técnicas de fabrico de olaria entre outras. No concelho de Carregal do Sal são exemplos atribuíveis a este período o sítio de habitat do Mimosal na freguesia de Oliveira do Conde e o povoado da Quinta Nova na localidade de Sobral.
Depois do período Calcolítico, segue-se a Idade do Bronze que, grosso modo, se caracteriza pelo desenvolvimento e intensificação do fabrico e uso de objetos de metal, permitindo assim o desenvolvimento das atividades económicas e o aumento exponencial da exploração e controlo das áreas ricas em minério. Deposições votivas tardias na zona frontal do corredor da Orca de Fiais da Telha, incluindo um punhal em cobre arsenical, bem como alguns fragmentos de olaria da Orca de Travanca testemunham esta etapa no concelho de Carregal do Sal.
O período da Idade do Ferro, caracteriza-se genericamente pela difusão deste metal em detrimento do bronze, destacando-se a sua maior durabilidade e a existência em maior quantidade na natureza em relação ao bronze. Um bom exemplo de um “lugar central” deste período em terras do concelho de Carregal do Sal é o sítio do Outeiro dos Castelos em Beijós, de onde provém uma faca “afalcatada” em ferro. Os povoados deste período (castros), denunciando preocupação defensiva, implantam-se em zonas estratégicas, com amplo domínio visual sendo detentores de condições ótimas de defesa e fácil acesso a recursos.
A presença da civilização romana no nosso concelho também está bem patente sob a forma de vestígios diversos, sendo o sítio de Chãs na localidade de Beijós, de onde proveio uma placa funerária epigrafada, o exemplo mais representativo. Vários outros vestígios atestam a presença romana no concelho de Carregal do Sal sob a forma de vários materiais cerâmicos deste período encontrados à superfície, denunciando a existência de assentamentos de cronologia romana. Dois Marcos Miliários no sítio de Vale de Touro, comprovam a existência e passagem de uma rede viária em solo concelhio que eventualmente permitiria a ligação à Splendidissima Civitas de Bobadela e a Vissaium (Viseu).
Entre o fim do império romano até meados do séc. XV, a arqueologia funerária da Idade Média, ultimamente enquadrada entre os séc. VI/VII e XI, chegou até nós pela presença de dezenas de sepulturas escavadas na rocha de diversas tipologias e morfologias, dispersas um pouco por todo o território concelhio. São testemunhos incontornáveis do mundo funerário desta época e dos poucos vestígios que nos restam para compreender o povoamento e história deste período. A presença de estelas de cabeceira de sepultura esculpidas em pedra e posteriormente colocadas na cabeceira destes jazigos, são de igual forma sinais que nos permitem mergulhar e teorizar sobre estas manifestações medievais de cariz funerário.
Em terras Carregalenses, do período do Renascimento, temos a obra emblemática e classificada como monumento nacional desde 1910, o túmulo de Fernão Gomes de Góis, camareiro-mor de D. João I, exibe uma riqueza decorativa ímpar, apresentando-se como o motivo mais sumptuoso da igreja matriz de Oliveira do Conde. Este edifício religioso ostenta uma exuberante riqueza arquitetónica e escultórica. Ao lado e classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1993 o pelourinho Manuelino de Oliveira do Conde, erguido na sequência do foral novo de D. Manuel datado de 1516, simboliza a jurisdição municipal, tendo sido o palco de divulgação das decisões e posturas camarárias.
Da Idade Moderna em Carregal do Sal, persistem vários solares e diversos imóveis de arquitetura nobre beirã, onde se encontram patentes os estilos maneirista e barroco, representativos desta época. Desta distinta arquitetura dos séculos XVII a XIX, podemos destacar o Solar dos Soares de Albergaria, classificado com Imóvel de Interesse Público, na vila de Oliveira do Conde, ou a Casa de Oliveirinha, classificada também como IIP, como exemplo de residências nobres setecentistas, entre muitos outros.
Desta época chegou ainda até nós um vasto e riquíssimo património religioso que está bem patente na edificação de variados edifícios religiosos, sejam igrejas ou capelas, cujas manifestações que lhes estão associadas, nos remetem para tradições seculares.
Durante a Época Contemporânea o concelho é marcado e centrado nas suas principais atividades económicas como a pastorícia, a indústria das madeiras (marcenaria), a viticultura e a moagem de cereais com a presença ainda de inúmeros moinhos a salpicar as diversas linhas de água que rasgam o concelho.
De referir também a existência de dezenas de alminhas localizadas habitualmente à beira de caminhos rurais e nas encruzilhadas dos mesmos, como representações populares das almas do purgatório que suplicam rezas e esmolas.
A contemporaneidade carregalense é também incontornavelmente assinalada pela memória de Aristides de Sousa Mendes, o cônsul português que salvou cerca de 30.000 vidas do holocausto nazi e cuja residência pode ser visitada na vila de Cabanas de Viriato. A Casa do Passal está classificada como Monumento Nacional desde maio de 2011.
Grande parte do património atrás descrito encontra-se visitável e faz parte integrante de 4 percursos patrimoniais e arqueológicos do concelho nomeadamente o Circuito Pré-histórico Fiais/Azenha na freguesia de Oliveira do Conde, o Circuito Arqueológico da Cova da Moira na freguesia de Carregal do Sal, o Circuito Patrimonial das Cimalhinhas na freguesia de Cabanas de Viriato e o Circuito Patrimonial de Chãs na freguesia de Beijós.
De igual modo parte deste património pode ser contemplado se calcorrear qualquer um dos 3 percursos pedestres concelhios homologados pela Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal: PR1 Rota da Pinha e do Pinhão, PR2 Rota dos Narcissus e GR48 Orla do Mondego.
O Museu Municipal Manuel Soares de Albergaria acolhe diverso e variado espólio representativo do património concelhio pelo que merece uma visita atenta e demorada.